Eudes Quintino de Oliveira Júnior*
Os costumes vão se modificando de acordo com o aperfeiçoamento das relações humanas, muitas vezes, independentemente do regramento legal. O homem vai atingindo novas realidades até então desconhecidas e no dia a dia familiariza-se com as condutas que se avizinham e se incorporam definitivamente nos parâmetros tradicionais, após passar pelo crivo do patrulhamento comportamental.A união homossexual, antes vista como uma decomposição moral com força ameaçadora de minar os alicerces da própria família, tão distante da realidade brasileira, bate às portas de nossos Tribunais e exigem seu reconhecimento. O Direito, como instrumento de regulação, deve caminhar de braços dados com as transformações sociais, com a finalidade de adequar aquelas que encontram respaldo no ordenamento constitucional e ordená-las legalmente.
A orientação sexual, como exercício de um direito legitimamente consagrado nos princípios da dignidade da pessoa humana, no da isonomia e na discriminação de qualquer preconceito, aflorou e busca sua sedimentação legislativa. Se há respeito mútuo, afeto e convívio estável entre pessoas do mesmo sexo, há geração de direitos e obrigações que devem ser tutelados pelo Estado.
A lei brasileira não permite o casamento de pessoas do mesmo sexo, como a Argentina aprovou recentemente. Mas, paulatinamente, várias decisões jurisprudenciais vão contaminando o núcleo proibitivo, abrindo novos clarões e produzindo efeitos jurídicos ao relacionamento homoafetivo, que já foi erigido à categoria de entidade familiar.
Já se reconheceu o direito de homossexual à pensão por morte do parceiro, com a edição de uma Instrução Normativa do INSS conferindo tratamento isonômico entre a sociedade de fato constituída por heterossexuais com a estabelecida entre os homossexuais. Após a morte da cantora Cássia Eller, em que a companheira dela comoveu o país para obter e conseguir a guarda definitiva do filho da cantora, que foi criado pelas duas, os tribunais conferem aqui e acolá adoções a conviventes homossexuais, desde que preencham os requisitos exigidos.
Daí que Terceiro Programa Nacional de Direitos Humanos, criado pelo Decreto Presidencial em janeiro de 2010, destaca o reconhecimento da união civil entre pessoas do mesmo sexo, sugerindo ao Congresso Nacional que altere a legislação e que se estenda também a elas o direito à adoção. Paralelamente, tramita pelo Supremo Tribunal Federal uma ação de Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental com a finalidade de reconhecer a união entre as pessoas do mesmo sexo como entidade familiar, desde que sejam atendidos os requisitos estabelecidos na união estável entre homem e mulher.
A Receita Federal, acatando parecer da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional admitiu a inclusão de companheiro como dependente na declaração de imposto de renda desde que seja juntado o documento particular de coabitação por mais de cinco anos ou em prazo menor se da união resultou filho.
Na câmara dos Deputados tramita o PL 122 (clique aqui) de 2006, a respeito da criminalização da homofobia, que compreende a liberdade de orientação sexual e identidade de gênero. O tipo incriminador é lançado nos mesmos moldes da discriminação de raça, cor, sexo, gênero, etnia, procedência nacional e religião, culminando pena de reclusão.
Desta forma, o caminho até agora percorrido deixa bem claro que ninguém pode ser discriminado por uma escolha fundada no exercício do direito de diversidade para encontrar a perfeita adequação da dignidade humana.
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*Promotor de Justiça aposentado/SP. Advogado e reitor do Centro Universitário do Norte Paulista - Unorp
Fonte: migalhas.com.br